31 de março de 2011

Descartes

Para Descartes, o sujeito "é uma coisa que pensa, quer dizer, que duvida, que afirma, que nega, que conhece poucas coisas, que ignora muitas, que quer, que não quer, que também imagina e que sente".

30 de março de 2011

Obra de Camilo em leilão no Porto

«Está a decorrer no Porto um leilão com obras de Camilo Castelo Branco. Os livros fazem parte de uma biblioteca particular com cerca de dois mil títulos que está à venda até ao próximo sábado, no salão nobre da Junta de Freguesia do Bonfim. Apesar de o leilão decorrer até ao próximo sábado, os lotes relativos à obra camiliana começaram a ser vendidos esta terça-feira, ficando alguns disponíveis ainda para a sessão desta quarta-feira, marcada para as 21 horas. Pela sua raridade, títulos como "Horas de lucta" e "A infanta capellista" serão dos mais cobiçados na iniciativa, promovida pela Livraria Manuel Ferreira. Chegando quase aos 300 livros, a biblioteca camiliana destaca-se neste leilão de quase duas mil obras. A colecção pertence aos herdeiros de José de Sá Monteiro de Frias, destacada figura de Sintra que foi cliente da Livraria Manuel Ferreira durante mais de 40 anos. (...) Herculano Ferreira, responsável pelo leilão, refere que o mundo de Camilo é muito peculiar, sublinhando que o romancista "tem um lugar ímpar entre todos, no mundo da bibliofilia". Não só pela obra extensa que deixou, mas também por os seus livros serem de "produção rústica", com capas muito frágeis. Esse facto levava os proprietários a encadernar os livros, para melhor os preservarem. "Hoje em dia, é raro encontrar o original, com a capa de brochura", diz, a propósito. A isso podemos somar as edições raras e tiragens pequenas, também usuais no autor. Referindo que "ninguém tem uma biblioteca camiliana completa", aquele responsável reconhece, no entanto, que "há um conhecimento à volta de Camilo muito apurado". E o coleccionismo não pára de surpreender o livreiro, que conhece um exemplar das poesias "A Laura Geordano" em seda. Além das duas obras atrás referidas, vão a leilão nesta quarta-feira, também de Camilo, títulos como "Memorias do carcere", que escreveu sobre o tempo passado na cadeia da Relação, ou o opúsculo "Maria! Não me mates, que sou tua mãi!". (...)
Base de licitação mais elevada

O título que tem a base de licitação mais elevada é "Horas de lucta", no valor de 1500 euros. É uma das mais raras, cobiçadas e valiosas peças de toda a bibliografia camiliana. Só se imprimiram 32 exemplares, sendo este lote em particular o que foi dedicado a Ana Plácido, que viria a ser mulher de Camilo.
Com uma base de licitação de 1000 euros parte para leilão o lote correspondente ao livro "A infanta capellista", uma primeira edição que vai, por certo, merecer também renhida disputa entre os coleccionadores que se apresentem na Junta de Freguesia do Bonfim. http://www.jn.pt/PaginaInicial/Cultura/Interior.aspx?content_id=1818834&page=1

29 de março de 2011

Man On Wire

"Homem no Arame" é um olhar à ousada mas ilegal proeza de Philippe Petit efectuada em 1974... a sua corajosa mas perigosa passagem a pé sob um arame suspenso no ar, a 410 metros de altura, entre as Torres Gémeas do World Trade Center de Nova Iorque. Acontecimento esse que alguns consideraram ter sido "O Crime Artístico do Século".

24 de março de 2011

O professor primário

«O meu pai era tecelão, a minha mãe ocupava-se da casa e dos campos com os meus avós.
Sempre considerei a profissão de professor a mais bela das profissões. Certamente a influência da minha família foi preponderante nesta escolha: 1º, porque os meus pais eram pouco instruídos (e os meus avós analfabetos), falavam-me sempre dos benefícios da instrução [...]; 2º, tal como os meus pais, considerava invejável a profissão de professor, porque o ordenado era seguro e me parecia suficiente, enquanto na nossa casa debatíamo-nos com poucos ganhos; 3º, ainda, pensava sobretudo na dureza dos trabalhos rurais no Verão, no meu pai puxando sem descanso a lançadeira num canto da cavalariça, a tecer os panos, de tal modo que passei a considerar o professor um privilegiado e a sua profissão pouco fatigante (mudei de opinião depois!).»
Testemunho citado em J. Ozouf, 1993 - Nous, Les Maîtres d'École, Paris, Gallimard

22 de março de 2011

Carta (Esboço)

Lembro-me agora que tenho de marcar um
encontro contigo, num sítio em que ambos
nos possamos falar, de facto, sem que nenhuma
das ocorrências da vida venha
interferir no que temos para nos dizer. Muitas
vezes me lembrei de que esse sítio podia
ser, até, um lugar sem nada de especial,
como um canto de café, em frente de um espelho
que poderia servir de pretexto
para reflectir a alma, a impressão da tarde,
o último estertor do dia antes de nos despedirmos,
quando é preciso encontrar uma fórmula que
disfarce o que, afinal, não conseguimos dizer. É
que o amor nem sempre é uma palavra de uso,
aquela que permite a passagem à comunicação ;
mais exacta de dois seres, a não ser que nos fale,
de súbito, o sentido da despedida, e que cada um de nós
leve, consigo, o outro, deixando atrás de si o próprio
ser, como se uma troca de almas fosse possível
neste mundo. Então, é natural que voltes atrás e
me peças: «Vem comigo!», e devo dizer-te que muitas
vezes pensei em fazer isso mesmo, mas era tarde,
isto é, a porta tinha-se fechado até outro
dia, que é aquele que acaba por nunca chegar, e então
as palavras caem no vazio, como se nunca tivessem
sido pensadas. No entanto, ao escrever-te para marcar
um encontro contigo, sei que é irremediável o que temos
para dizer um ao outro: a confissão mais exacta, que
é também a mais absurda, de um sentimento; e, por
trás disso, a certeza de que o mundo há-de ser outro no dia
seguinte, como se o amor, de facto, pudesse mudar as cores
do céu, do mar, da terra, e do próprio dia em que nos vamos
encontrar, que há-de ser um dia azul, de verão, em que
o vento poderá soprar do norte, como se fosse daí
que viessem, nesta altura, as coisas mais precisas,
que são as nossas: o verde das folhas e o amarelo
das pétalas, o vermelho do sol e o branco dos muros.

Nuno Júdice, in “Poesia Reunida”

Escritor, poeta e ensaísta português, natural de Mexilhoeira Grande, Portimão.

21 de março de 2011

Dia Mundial da Poesia

«Ela canta, pobre ceifeira,
Julgando-se feliz talvez;
Canta, e ceifa, e a sua voz, cheia
De alegre e anónima viuvez,

Ondula como um canto de ave
No ar limpo como um limiar,
E há curvas no enredo suave
Do som que ela tem a cantar.

Ouvi-la alegra e entristece,
Na sua voz há o campo e a lida,
E canta como se tivesse
Mais razões p'ra cantar que a vida.

Ah, canta, canta sem razão!
O que em mim sente 'stá pensando.
Derrama o meu coração
A tua incerteza voz ondeando!

Ah, poder ser tu, sendo eu!
Ter a tua alegre inconsciência
E a consciência disso! Ó céu!
Ó campo! Ó canção! A ciência

Pesa tanto e a vida é tão breve!
Entrai por mim dentro! Tornai
Minha alma a vossa sombra leve!
Depois, levando-me, passai!»
Fernando Pessoa

E ainda:
- Dia Mundial da Árvore/Floresta;
- Primavera.

19 de março de 2011

Almada Negreiros

Biografia
Almada Negreiros nasceu em São Tomé e Principie a 7 de Abril de 1893.
Foi um dos fundadores da revista Orpheu em 1915, onde conviveu com Fernando Pessoa.
O pai de Almada inscreveu-o no Colégio de Campolide, onde estudou de 1900 a 1910.
Em 1911 passou ainda pelo liceu de Coimbra e só em 1912 ingressa na Escola Nacional de Belas Artes, em Lisboa. Vai distinguir-se, essencialmente, pela caricatura.
Em 1919, insatisfeito com os seus estudos em Portugal, foi para Paris estudar pintura e onde apreende novidades plásticas e literárias. Viveu em Espanha entre 1927 e 1932.
Além da Literatura e da Pintura a óleo, Almada desenvolveu ainda composições coreográficas para ballet.
Ele trabalhou em tapeçaria, gravura, pintura mural, caricatura, mosaico, azulejo e vitral.
As suas obras mais conhecidas são: Saltimbancos, K4 O Quadrado Azul, A Engomadeira, A Invenção do Dia Claro e Nome de Guerra. Escreveu ainda textos doutrinários, peças de teatro e organizou conferências.
Almada Negreiros, morreu em 14 de Junho de 1970, de falha cardíaca, no mesmo quarto do Hospital de São Luís dos Franceses, onde também tinha morrido Fernando Pessoa.

Características da sua Arte
Almada Negreiros tinha duas orientações de busca e criação, que foram a beleza e a sabedoria. Para ele a beleza não podia ser ignorante e idiota, assim como a beleza não podia ser feia e triste.
Ele foi praticante de uma arte elaborada que prevêem de uma aprendizagem que não acaba nas escolas de arte. Almada teve como tema principal o número, a geometria e os seus significados.
Ele revela-se um neopitagórico, sendo este o seu lado a fonte mais profunda da sua inspiração e criatividade.

Pintura
A pintura de Almada Negreiros é hoje unanimemente reconhecida como o verdadeiro símbolo da arte moderna portuguesa. O génio e a obra de Almada foram fruto de uma evolução influenciada quer pelos movimentos contemporâneos quer pelo contacto com a arte e sabedoria ancestrais.
Almada Negreiros pintou variadas obras em óleo sobre tela, mas os mais famosos são sem dúvida, os que se encontram na Colecção Permanente do Centro de Arte Moderna e na Fundação Calouste Gulbenkian.

(http://www.eccn.edu.pt/alunos/joanaq_elisa/almada_negreiros.htm)

A Flor
Pede-se a uma criança: Desenhe uma flor! Dá-se
-lhe papel e lápis. A criança vai sentar-se no outro
canto da sala onde não há mais ninguém.
Passado algum tempo o papel está cheio de
linhas. Umas numa direcção , outras noutras;
umas mais carregadas, outras mais leves; umas
mais fáceis, outras mais custosas. A criança quis
tanta força em certas linhas que o papel quase que
não resistiu.
Outras eram tão delicadas que apenas o peso do
lápis já era de mais.
Depois a criança vem mostrar essas linhas às
pessoas: uma flor!
As pessoas não acham parecidas estas linhas com
as de uma flor!
Contudo, a palavra flor andou por dentro da
criança, da cabeça para o coração e do coração
para a cabeça, à procura das linhas com que se faz
uma flor, e a criança pôs no papel algumas dessas
linhas, ou todas. Talvez as tivesse posto fora dos
seus lugares, mas são aquelas as linhas com que
Deus faz uma flor!
Almada Negreiros

18 de março de 2011

Mais uma vez, TNSJ

Exactamente Antunes
“Nós não somos do século de inventar as palavras. As palavras já foram inventadas. Nós somos do século de inventar outra vez as palavras que já foram inventadas.” Com Exactamente Antunes, é como se Jacinto Lucas Pires – concitado por Nuno Carinhas – respondesse ao apelo de Almada Negreiros, desencaminhando-lhe Nome de Guerra para a cena. Obra de uma prodigiosa frescura e ingenuidade, o romance instala-nos no percurso (ou carrossel) iniciático de Antunes, provinciano sacudido pelos acasos da sorte na grande cidade, que, entre o clube nocturno e o quarto de hotel, acumula a experiência bastante para concluir que… nenhum saber resulta da acumulação de experiência. Partilhando com Almada o prazer dos paradoxos e a lúdica reinvenção da linguagem, Jacinto Lucas Pires explora a teatralidade que informa este “espectáculo de um homem em luta livre consigo mesmo”, ora pirandellizando-o – por lá irrompe, em futurista fato-macaco, o Autor em busca da sua personagem –, ora brechtianizando-o, ao projectar em cena títulos de capítulos e outras sentenças, irónicas e desconcertantes. Nuno Carinhas assume, enquanto cenógrafo e figurinista, o papel de tridimensionar esta “obra-prima de desenho”, como lhe chamou David Mourão-Ferreira. A encenação, partilha-a com Cristina Carvalhal, num gesto de celebração do génio de Almada, para quem o teatro é “o escaparate de todas as artes”.

de
Jacinto Lucas Pires
a partir de
"Nome de Guerra", de Almada Negreiros
encenação
Cristina Carvalhal, Nuno Carinhas
cenografia e figurinos
Nuno Carinhas
desenho de luz
Nuno Meira
desenho de som
Francisco Leal
preparação vocal e elocução
João Henriques
interpretação
Joana Carvalho, João Castro, Jorge Mota, José Eduardo Silva, Lígia Roque, Mané Carvalho, Paulo Freixinho, Paulo Moura Lopes
produção
TNSJ
classificação etária
M/12 anos

2 de março de 2011

«Nunca acreditei que a liberdade do homem consiste em não fazer o que quer, mas sim em nunca fazer o que não quer, e foi essa liberdade que sempre reclamei, que muitas vezes conservei, e me tornou mais escandaloso aos olhos dos meus contemporâneos. Porque eles, activos, inquietos, ambiciosos, detestando a liberdade nos outros e não a querendo para si próprios, desde que por vezes façam a sua vontade, ou melhor, desde que dominem a de outrem, obrigam-se durante toda a sua vida a fazer o que lhes repugna, e não descuram todo e qualquer servilismo que lhes permita dominar.»
Jean-Jacques Rousseau, in 'Os Devaneios do Caminhante Solitário'


«Viver é não saber que se vive»
Florbela Espanca