8 de novembro de 2011
2 de novembro de 2011
Almada Negreiros
«Nós não somos do século de inventar as palavras. Nós somos do século de inventar outra vez as palavras que já foram inventadas.»
1 de novembro de 2011
Com palavras
Com palavras me ergo em cada dia!
Com palavras lavo, nas manhãs, o rosto
E saio para a rua.
Com palavras — inaudíveis — grito
Para rasgar os risos que nos cercam.
Ah!, de palavras estamos todos cheios.
Possuímos arquivos, sabemo-las de cor
Em quatro ou cinco línguas.
Tomamo-las à noite em comprimidos
Para dormir o cansaço.
As palavras embrulham-se na língua.
As mais puras transformam-se, violáceas,
Roxas de silêncio. De que servem
Asfixiadas em saliva, prisioneiras?
Possuímos, das palavras, as mais belas;
As que seivam o amor, a liberdade…
Engulo-as perguntando-me se um dia
As poderei navegar; se alguma vez
Dilatarei o pulmão que as encerra.
Atravessa-nos um rio de palavras:
Com elas eu me deito, me levanto,
E faltam-me palavras para contar…
Egito Gonçalves
Com palavras lavo, nas manhãs, o rosto
E saio para a rua.
Com palavras — inaudíveis — grito
Para rasgar os risos que nos cercam.
Ah!, de palavras estamos todos cheios.
Possuímos arquivos, sabemo-las de cor
Em quatro ou cinco línguas.
Tomamo-las à noite em comprimidos
Para dormir o cansaço.
As palavras embrulham-se na língua.
As mais puras transformam-se, violáceas,
Roxas de silêncio. De que servem
Asfixiadas em saliva, prisioneiras?
Possuímos, das palavras, as mais belas;
As que seivam o amor, a liberdade…
Engulo-as perguntando-me se um dia
As poderei navegar; se alguma vez
Dilatarei o pulmão que as encerra.
Atravessa-nos um rio de palavras:
Com elas eu me deito, me levanto,
E faltam-me palavras para contar…
Egito Gonçalves
27 de outubro de 2011
Conselho
Cerca de grandes muros quem te sonhas.
Depois,onde é visível o jardim
Através do portão de grade dada,
Põe quantas flores são os mais risonhas,
Para que te conheçam só assim.
Onde ninguém o vir não nada.
Faz canteiros como os que outros têm,
Onde os olhares possam entrever
O teu jardim como lho vais mostrar.
Mas onde és teu,e nunca o vê ninguém,
Deixa as flores que vêm do chão crescer
E deixa as ervas naturais medrar.
Faz de ti um duplo ser guardado;
E que ninguém; que veja e fite, possa
Saber mais que um jardim de quem tu és-
Um jardim mais ostensivo e reservado,
Por trás do qual a flor nativa roça
A erva tão pobre que nem tu a vês...
Fernando Pessoa
«o poema inicia-se pela introdução de um símbolo: o jardim, que representa o "eu". Pessoa diz-nos que devemos cercar de grandes muros quem nos sonhamos. Ou seja, o nosso interior, o nosso sonho de nós mesmos nunca deve ser revelado aos outros. O exterior deve ser feito só de "flores (...) mais risonhas / Para que te conheçam só assim". Aqui Pessoa pretende dar a conhecer a sua opinião sobre como devemos revelar aos outros em nosso redor quem verdadeiramente somos.
A segunda estrofe reforça a entrada feita pela primeira estrofe: devemos tentar passar despercebidos no mundo exterior, para que ninguém ponha em causa os nossos sonhos. É por isso que ele diz: "Faz canteiros como os que outros têm, / Onde os olhares possam entrever / O teu jardim como lho vais mostrar". Já o interior, o "onde és teu", é uma zona que nunca deve ser revelada. Aí tudo pode crescer livremente - as flores que vêm do chão e mesmo as ervas naturais e selvagens.
A visão dupla da vida - interior e exterior - é adoptada totalmente na terceira estrofe: "Faz de ti um duplo guardado". Há uma aparência completa, um jardim perfeito em forma de máscara absurda, que serve ao homem na sua vida quotidiana; enquanto que no interior tudo é dominado pelo sonho, pelas flores selvagens e pela erva que cresce erraticamente.»
Depois,onde é visível o jardim
Através do portão de grade dada,
Põe quantas flores são os mais risonhas,
Para que te conheçam só assim.
Onde ninguém o vir não nada.
Faz canteiros como os que outros têm,
Onde os olhares possam entrever
O teu jardim como lho vais mostrar.
Mas onde és teu,e nunca o vê ninguém,
Deixa as flores que vêm do chão crescer
E deixa as ervas naturais medrar.
Faz de ti um duplo ser guardado;
E que ninguém; que veja e fite, possa
Saber mais que um jardim de quem tu és-
Um jardim mais ostensivo e reservado,
Por trás do qual a flor nativa roça
A erva tão pobre que nem tu a vês...
Fernando Pessoa
«o poema inicia-se pela introdução de um símbolo: o jardim, que representa o "eu". Pessoa diz-nos que devemos cercar de grandes muros quem nos sonhamos. Ou seja, o nosso interior, o nosso sonho de nós mesmos nunca deve ser revelado aos outros. O exterior deve ser feito só de "flores (...) mais risonhas / Para que te conheçam só assim". Aqui Pessoa pretende dar a conhecer a sua opinião sobre como devemos revelar aos outros em nosso redor quem verdadeiramente somos.
A segunda estrofe reforça a entrada feita pela primeira estrofe: devemos tentar passar despercebidos no mundo exterior, para que ninguém ponha em causa os nossos sonhos. É por isso que ele diz: "Faz canteiros como os que outros têm, / Onde os olhares possam entrever / O teu jardim como lho vais mostrar". Já o interior, o "onde és teu", é uma zona que nunca deve ser revelada. Aí tudo pode crescer livremente - as flores que vêm do chão e mesmo as ervas naturais e selvagens.
A visão dupla da vida - interior e exterior - é adoptada totalmente na terceira estrofe: "Faz de ti um duplo guardado". Há uma aparência completa, um jardim perfeito em forma de máscara absurda, que serve ao homem na sua vida quotidiana; enquanto que no interior tudo é dominado pelo sonho, pelas flores selvagens e pela erva que cresce erraticamente.»
26 de outubro de 2011
25 de outubro de 2011
24 de outubro de 2011
12 de outubro de 2011
Sou um Evadido
Sou um evadido.
Logo que nasci
Fecharam-me em mim,
Ah, mas eu fugi.
Se a gente se cansa
Do mesmo lugar,
Do mesmo ser
Por que não se cansar?
Minha alma procura-me
Mas eu ando a monte
Oxalá que ela
Nunca me encontre.
Ser um é cadeia,
Ser eu é não ser.
Viverei fugindo
Mas vivo a valer.
Fernando Pessoa
Logo que nasci
Fecharam-me em mim,
Ah, mas eu fugi.
Se a gente se cansa
Do mesmo lugar,
Do mesmo ser
Por que não se cansar?
Minha alma procura-me
Mas eu ando a monte
Oxalá que ela
Nunca me encontre.
Ser um é cadeia,
Ser eu é não ser.
Viverei fugindo
Mas vivo a valer.
Fernando Pessoa
11 de outubro de 2011
Sísifo
Recomeça…
Se puderes,
Sem angústia e sem pressa.
E os passos que deres,
Nesse caminho duro
Do futuro,
Dá-os em liberdade.
Enquanto não alcances
Não descanses.
De nenhum fruto queiras só metade.
E, nunca saciado,
Vai colhendo
Ilusões sucessivas no pomar
E vendo
Acordado,
O logro da aventura.
És homem, não te esqueças!
Só é tua a loucura
Onde, com lucidez, te reconheças.
Miguel Torga
Se puderes,
Sem angústia e sem pressa.
E os passos que deres,
Nesse caminho duro
Do futuro,
Dá-os em liberdade.
Enquanto não alcances
Não descanses.
De nenhum fruto queiras só metade.
E, nunca saciado,
Vai colhendo
Ilusões sucessivas no pomar
E vendo
Acordado,
O logro da aventura.
És homem, não te esqueças!
Só é tua a loucura
Onde, com lucidez, te reconheças.
Miguel Torga
9 de outubro de 2011
6 de outubro de 2011
João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.
Drummond de Andrade
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.
Drummond de Andrade
5 de outubro de 2011
4 de outubro de 2011
sábado: dia de feira
Bem, no passado sábado tive uma experiência nova: estive a vender numa feira.
Esta feira realizou-se na Sé do Porto e como podem verificar na foto, tinha um ambiente de festa e o calor ajudou a trazer muitas, mas mesmo muitas pessoas até lá. A maioria dos vendedores eram jovens e que estavam a vender coisas/roupas antigas, bijuteria, bolos, bebidas, brinquedos, um pouco de tudo. Houve também música ao vivo e muita animação que nos proporcionou muitas gargalhadas. Foi uma experiência muito engraçada e onde pude também ver os bastidores das feiras, um lado onde por vezes não compreendemos. Nesta iniciativa tivemos também opoertunidade de conhecer pessoas novas e muito simpáticas, algo que me deixa muito feliz!
Esta feira realizou-se na Sé do Porto e como podem verificar na foto, tinha um ambiente de festa e o calor ajudou a trazer muitas, mas mesmo muitas pessoas até lá. A maioria dos vendedores eram jovens e que estavam a vender coisas/roupas antigas, bijuteria, bolos, bebidas, brinquedos, um pouco de tudo. Houve também música ao vivo e muita animação que nos proporcionou muitas gargalhadas. Foi uma experiência muito engraçada e onde pude também ver os bastidores das feiras, um lado onde por vezes não compreendemos. Nesta iniciativa tivemos também opoertunidade de conhecer pessoas novas e muito simpáticas, algo que me deixa muito feliz!
22 de setembro de 2011
Prazeres
O primeiro olhar da janela de manhã
O velho livro de novo encontrado
Rostos animados
Neve, o mudar das estações
O jornal
O cão
A dialéctica
Tomar duche, nadar
Velha música
Sapatos cómodos
Compreender
Música nova
Escrever, plantar
Viajar, cantar
Ser amável.
Bertold Brecht, in 'Do Pobre B.B.'
O velho livro de novo encontrado
Rostos animados
Neve, o mudar das estações
O jornal
O cão
A dialéctica
Tomar duche, nadar
Velha música
Sapatos cómodos
Compreender
Música nova
Escrever, plantar
Viajar, cantar
Ser amável.
Bertold Brecht, in 'Do Pobre B.B.'
21 de setembro de 2011
o livro eleito
Hoje estive a escolher o livro que mais apreciei neste verão. E foi «A Cabana» de WM. Paul Young. O livro é muito simples mas o seu conteúdo é muito, muito bom.
E por aqui deixo um dos vários excertos que mais gostei:
"Há ocasiões em que optamos por acreditar em algo que normalmente seria considerado absolutamente irracional. Isso não significa que seja realmente irracional; mas, certamente, não é racional. Talvez exista a suprarracionalidade: a razão que transcede as definições normais dos factos ou a lógica baseada em dados. Algo que só faz sentido se conseguirmos vislumbrar um quadro mais amplo da realidade. Talvez seja aí que a fé se enquadre."
E por aqui deixo um dos vários excertos que mais gostei:
"Há ocasiões em que optamos por acreditar em algo que normalmente seria considerado absolutamente irracional. Isso não significa que seja realmente irracional; mas, certamente, não é racional. Talvez exista a suprarracionalidade: a razão que transcede as definições normais dos factos ou a lógica baseada em dados. Algo que só faz sentido se conseguirmos vislumbrar um quadro mais amplo da realidade. Talvez seja aí que a fé se enquadre."
17 de setembro de 2011
16 de setembro de 2011
uma notícia bastante agradável
«Há mais jovens a considerar que a leitura é importante para a sua vida pessoal. Em 2007, entre os que tinham 15 a 24 anos, 30,6% consideraram-na "muito importante". Em Março passado, neste grupo etário, já eram 52,4% os que afirmaram o mesmo. (...)
Os resultados do último Barómetro de Opinião Pública PNL, com um inquérito desenvolvido em Março passado junto de uma amostra de 1257 indivíduos, mostram que é no grupo dos 15 aos 24 anos que se registou um maior aumento entre aqueles que consideram a leitura "muito importante" para a sua vida pessoal. A avaliação externa do plano é feita por uma equipa do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa, coordenada por António Firmino da Costa. O primeiro estudo de avaliação foi divulgado em 2008.»
in http://www.publico.pt/Educação/mais-de-metade-dos-jovens-portugueses-valorizam-a-leitura_1511882
Esta notícia baseada num inquérito deixou-me bastante contente. Acho que a cultura dos jovens não está assim tão má como às vezes pensamos. Não há muito tempo descobri que o simples acto de ler é demasiado importante para a nossa cultura e até mesmo a nossa vida. Sem dúvida, que só nos favorece na maneira de falar, de escrever, de pensar e de tudo o resto. Por isso é um hábito que temos de cultivar cada vez mais para nos tornamos pessoas mais sábias!
Os resultados do último Barómetro de Opinião Pública PNL, com um inquérito desenvolvido em Março passado junto de uma amostra de 1257 indivíduos, mostram que é no grupo dos 15 aos 24 anos que se registou um maior aumento entre aqueles que consideram a leitura "muito importante" para a sua vida pessoal. A avaliação externa do plano é feita por uma equipa do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa, coordenada por António Firmino da Costa. O primeiro estudo de avaliação foi divulgado em 2008.»
in http://www.publico.pt/Educação/mais-de-metade-dos-jovens-portugueses-valorizam-a-leitura_1511882
Esta notícia baseada num inquérito deixou-me bastante contente. Acho que a cultura dos jovens não está assim tão má como às vezes pensamos. Não há muito tempo descobri que o simples acto de ler é demasiado importante para a nossa cultura e até mesmo a nossa vida. Sem dúvida, que só nos favorece na maneira de falar, de escrever, de pensar e de tudo o resto. Por isso é um hábito que temos de cultivar cada vez mais para nos tornamos pessoas mais sábias!
15 de setembro de 2011
os filmes deste verão:
Quem me conhece já sabe que adooooro ver filmes, então ir ao cinema é uma delícia... Mas dos muitos filmes que vi este verão, escolhi estes pois destacaram-se. O meu preferido destes cincos é sem dúvida o The Notebook ou Diário da nossa Paixão. A história é linda, romântica e faz pensar na vida, mas tenho de admitir que é um filme para ver a um sábado à tarde, tal como eu fiz :)
14 de setembro de 2011
(re)começar...
É no fim deste belo dia de verão (com muito calor, ufa!) que começo mais um post. Depois deste longo mês de férias onde muita coisa aconteceu, inclusive completei mais um ano de vida e deste período de descanso que soube tão bem, tenho mais um ano para percorrer e o último do secundário. Estou com a "bateria" bem cheia pois, tenho a certeza que vai ser cheio de trabalho mas isso não quer dizer que deixe de passar por aqui, pelo contrário vou tentar publicar ainda mais coisas. Espero que possas continuar sempre a espreitar este blog porque é mesmo feito para Ti.
20 de julho de 2011
7 de julho de 2011
entre a cidade sim e a cidade não
Sou um comboio rápido
que há muitos anos vai e vem
entre a cidade Sim
e a cidade Não.
Os meus nervos estão tensos
como cabos
entre a cidade Não
e a cidade Sim.
Tudo está morto e assustado na cidade Não.
É como um embrulho feito de tristeza.
Dentro dela todas as coisas franzem a testa.
Há medo nos olhos de todos os retratos.
De manhã enceram com bílis o soalho.
Os sofás são de falsidade, as paredes de miséria.
Nunca te darão nessa cidade um bom conselho,
nem um ramo de flores, nem um simples aceno.
As máquinas de escrever batem, com cópia,
a resposta:
"Não-não-não... não-não-não... não-não-não..."
E quando enfim se apagam as luzes
os fantasmas iniciam o seu lúgubre bailado.
Nunca, ainda que rebentes, arranjarás bilhete
para fugir da negra cidade. Não.
Ah, mas a vida na cidade Sim é um canto de ave.
Não tem paredes a cidade, é como um ninho.
As estrelas dizem que as acolhas nos teus braços.
E sem vergonha seus lábios pedem teus lábios,
num brando murmúrio: "São tudo tolices..."
A flor provocante implora que a cortes,
os rebanhos oferecem o leite com seus mugidos,
ninguém tem ponta de medo.
E aonde queiras ir te levam num instante comboios,
barcos, aviões,
e com um rumor antigo vai a água murmurando:
"Sim-sim-sim... sim-sim-sim... sim-sim-sim..."
Mas às vezes é certo que aborrece
ser-me dado, afinal, tudo sem esforço
nesta cidade Sim, deslumbrante de cor.
É melhor ir e vir até ao fim da minha vida
entre a cidade Sim
e a cidade Não!
É melhor ter os nervos tensos como cabos
entre a cidade Não
e a cidade Sim!
ievgueni ievtuchenko
dom quixote 1968
que há muitos anos vai e vem
entre a cidade Sim
e a cidade Não.
Os meus nervos estão tensos
como cabos
entre a cidade Não
e a cidade Sim.
Tudo está morto e assustado na cidade Não.
É como um embrulho feito de tristeza.
Dentro dela todas as coisas franzem a testa.
Há medo nos olhos de todos os retratos.
De manhã enceram com bílis o soalho.
Os sofás são de falsidade, as paredes de miséria.
Nunca te darão nessa cidade um bom conselho,
nem um ramo de flores, nem um simples aceno.
As máquinas de escrever batem, com cópia,
a resposta:
"Não-não-não... não-não-não... não-não-não..."
E quando enfim se apagam as luzes
os fantasmas iniciam o seu lúgubre bailado.
Nunca, ainda que rebentes, arranjarás bilhete
para fugir da negra cidade. Não.
Ah, mas a vida na cidade Sim é um canto de ave.
Não tem paredes a cidade, é como um ninho.
As estrelas dizem que as acolhas nos teus braços.
E sem vergonha seus lábios pedem teus lábios,
num brando murmúrio: "São tudo tolices..."
A flor provocante implora que a cortes,
os rebanhos oferecem o leite com seus mugidos,
ninguém tem ponta de medo.
E aonde queiras ir te levam num instante comboios,
barcos, aviões,
e com um rumor antigo vai a água murmurando:
"Sim-sim-sim... sim-sim-sim... sim-sim-sim..."
Mas às vezes é certo que aborrece
ser-me dado, afinal, tudo sem esforço
nesta cidade Sim, deslumbrante de cor.
É melhor ir e vir até ao fim da minha vida
entre a cidade Sim
e a cidade Não!
É melhor ter os nervos tensos como cabos
entre a cidade Não
e a cidade Sim!
ievgueni ievtuchenko
dom quixote 1968
6 de julho de 2011
Retrato de Mónica
«Mónica é uma pessoa tão extraordinária que consegue simultaneamente: ser boa mãe de família, ser chiquíssima, ser dirigente da «Liga Internacional das Mulheres Inúteis», ajudar o marido nos negócios, fazer ginástica todas as manhãs, ser pontual, ter imensos amigos, dar muitos jantares, ir a muitos jantares, não fumar, não envelhecer, gostar de toda a gente, gostar dela, dizer bem de toda a gente, toda a gente dizer bem dela, coleccionar colheres do séc. XVII, jogar golfe, deitar-se tarde, levantar-se cedo, comer iogurte, fazer ioga, gostar de pintura abstracta, ser sócia de todas as sociedades musicais, estar sempre divertida, ser um belo exemplo de virtudes, ter muito sucesso e ser muito séria.
Tenho conhecido na vida muitas pessoas parecidas com a Mónica. Mas são só a sua caricatura. Esquecem-se sempre ou do ioga ou da pintura abstracta.
Por trás de tudo isto há um trabalho severo e sem tréguas e uma disciplina rigorosa e constante. Pode-se dizer que Mónica trabalha de sol a sol.
De facto, para conquistar todo o sucesso e todos os gloriosos bens que possui, Mónica teve que renunciar a três coisas: à poesia, ao amor e à santidade.
A poesia é oferecida a cada pessoa só uma vez e o efeito da negação é irreversível. O amor é oferecido raramente e aquele que o nega algumas vezes depois não o encontra mais. Mas a santidade é oferecida a cada pessoa de novo cada dia, e por isso aqueles que renunciam à santidade são obrigados a repetir a negação todos os dias.
Isto obriga Mónica a observar uma disciplina severa. Como se diz no circo, «qualquer distracção pode causar a morte do artista». Mónica nunca tem uma distracção. Todos os seus vestidos são bem escolhidos e todos os seus amigos são úteis. Como um instrumento de precisão, ela mede o grau de utilidade de todas as situações e de todas as pessoas. E como um cavalo bem ensinado, ela salta sem tocar os obstáculos e limpa todos os percursos. Por isso tudo lhe corre bem, até os desgostos.
Os jantares de Mónica também correm sempre muito bem. Cada lugar é um emprego de capital. A comida é óptima e na conversa toda a gente está sempre de acordo, porque Mónica nunca convida pessoas que possam ter opiniões inoportunas. Ela põe a sua inteligência ao serviço da estupidez. Ou, mais exactamente: a sua inteligência é feita da estupidez dos outros. Esta é a forma de inteligência que garante o domínio. Por isso o reino de Mónica é sólido e grande.
Ela é íntima de mandarins e de banqueiros e é também íntima de manicuras, caixeiros e cabeleireiros. Quando ela chega a um cabeleireiro ou a uma loja, fala sempre com a voz num tom mais elevado para que todos compreendam que ela chegou. E precipitam-se manicuras e caixeiros. A chegada de Mónica é, em toda a parte, sempre um sucesso. Quando ela está na praia, o próprio Sol se enerva.
O marido de Mónica é um pobre diabo que Mónica transformou num homem importantíssimo. Deste marido maçador Mónica tem tirado o máximo rendimento. Ela ajuda-o, aconselha-o, governa-o. Quando ele é nomeado administrador de mais alguma coisa, é Mónica que é nomeada. Eles não são o homem e a mulher. Não são o casamento. São, antes, dois sócios trabalhando para o triunfo da mesma firma. O contrato que os une é indissolúvel, pois o divórcio arruína as situações mundanas. O mundo dos negócios é bem-pensante.
É por isso que Mónica, tendo renunciado à santidade, se dedica com grande dinamismo a obras de caridade. Ela faz casacos de tricot para as crianças que os seus amigos condenam à fome. Às vezes, quando os casacos estão prontos, as crianças já morreram de fome. Mas a vida continua. E o sucesso de Mónica também. Ela todos os anos parece mais nova. A miséria, a humilhação, a ruína não roçam sequer a fímbria dos seus vestidos. Entre ela e os humilhados e ofendidos não há nada de comum.
E por isso Mónica está nas melhores relações com o Príncipe deste Mundo. Ela é sua partidária fiel, cantora das suas virtudes, admiradora de seus silêncios e de seus discursos. Admiradora da sua obra, que está ao serviço dela, admiradora do seu espírito, que ela serve.
Pode-se dizer que em cada edifício construído neste tempo houve sempre uma pedra trazida por Mónica.
Há vários meses que não vejo Mónica. Ultimamente contaram-me que em certa festa ela estivera muito tempo conversando com o Príncipe deste Mundo. Falavam os dois com grande intimidade. Nisto não há evidentemente, nenhum mal. Toda a gente sabe que Mónica é seriíssima toda a gente sabe que o Príncipe deste Mundo é um homem austero e casto.
Não é o desejo do amor que os une. O que os une e justamente uma vontade sem amor.
E é natural que ele mostre publicamente a sua gratidão por Mónica. Todos sabemos que ela é o seu maior apoio; mais firme fundamento do seu poder.»
Sophia de Mello Breyner Andresen
Contos Exemplares
Porto, Figueirinhas, 1996 (29ª ed.).
Tenho conhecido na vida muitas pessoas parecidas com a Mónica. Mas são só a sua caricatura. Esquecem-se sempre ou do ioga ou da pintura abstracta.
Por trás de tudo isto há um trabalho severo e sem tréguas e uma disciplina rigorosa e constante. Pode-se dizer que Mónica trabalha de sol a sol.
De facto, para conquistar todo o sucesso e todos os gloriosos bens que possui, Mónica teve que renunciar a três coisas: à poesia, ao amor e à santidade.
A poesia é oferecida a cada pessoa só uma vez e o efeito da negação é irreversível. O amor é oferecido raramente e aquele que o nega algumas vezes depois não o encontra mais. Mas a santidade é oferecida a cada pessoa de novo cada dia, e por isso aqueles que renunciam à santidade são obrigados a repetir a negação todos os dias.
Isto obriga Mónica a observar uma disciplina severa. Como se diz no circo, «qualquer distracção pode causar a morte do artista». Mónica nunca tem uma distracção. Todos os seus vestidos são bem escolhidos e todos os seus amigos são úteis. Como um instrumento de precisão, ela mede o grau de utilidade de todas as situações e de todas as pessoas. E como um cavalo bem ensinado, ela salta sem tocar os obstáculos e limpa todos os percursos. Por isso tudo lhe corre bem, até os desgostos.
Os jantares de Mónica também correm sempre muito bem. Cada lugar é um emprego de capital. A comida é óptima e na conversa toda a gente está sempre de acordo, porque Mónica nunca convida pessoas que possam ter opiniões inoportunas. Ela põe a sua inteligência ao serviço da estupidez. Ou, mais exactamente: a sua inteligência é feita da estupidez dos outros. Esta é a forma de inteligência que garante o domínio. Por isso o reino de Mónica é sólido e grande.
Ela é íntima de mandarins e de banqueiros e é também íntima de manicuras, caixeiros e cabeleireiros. Quando ela chega a um cabeleireiro ou a uma loja, fala sempre com a voz num tom mais elevado para que todos compreendam que ela chegou. E precipitam-se manicuras e caixeiros. A chegada de Mónica é, em toda a parte, sempre um sucesso. Quando ela está na praia, o próprio Sol se enerva.
O marido de Mónica é um pobre diabo que Mónica transformou num homem importantíssimo. Deste marido maçador Mónica tem tirado o máximo rendimento. Ela ajuda-o, aconselha-o, governa-o. Quando ele é nomeado administrador de mais alguma coisa, é Mónica que é nomeada. Eles não são o homem e a mulher. Não são o casamento. São, antes, dois sócios trabalhando para o triunfo da mesma firma. O contrato que os une é indissolúvel, pois o divórcio arruína as situações mundanas. O mundo dos negócios é bem-pensante.
É por isso que Mónica, tendo renunciado à santidade, se dedica com grande dinamismo a obras de caridade. Ela faz casacos de tricot para as crianças que os seus amigos condenam à fome. Às vezes, quando os casacos estão prontos, as crianças já morreram de fome. Mas a vida continua. E o sucesso de Mónica também. Ela todos os anos parece mais nova. A miséria, a humilhação, a ruína não roçam sequer a fímbria dos seus vestidos. Entre ela e os humilhados e ofendidos não há nada de comum.
E por isso Mónica está nas melhores relações com o Príncipe deste Mundo. Ela é sua partidária fiel, cantora das suas virtudes, admiradora de seus silêncios e de seus discursos. Admiradora da sua obra, que está ao serviço dela, admiradora do seu espírito, que ela serve.
Pode-se dizer que em cada edifício construído neste tempo houve sempre uma pedra trazida por Mónica.
Há vários meses que não vejo Mónica. Ultimamente contaram-me que em certa festa ela estivera muito tempo conversando com o Príncipe deste Mundo. Falavam os dois com grande intimidade. Nisto não há evidentemente, nenhum mal. Toda a gente sabe que Mónica é seriíssima toda a gente sabe que o Príncipe deste Mundo é um homem austero e casto.
Não é o desejo do amor que os une. O que os une e justamente uma vontade sem amor.
E é natural que ele mostre publicamente a sua gratidão por Mónica. Todos sabemos que ela é o seu maior apoio; mais firme fundamento do seu poder.»
Sophia de Mello Breyner Andresen
Contos Exemplares
Porto, Figueirinhas, 1996 (29ª ed.).
4 de julho de 2011
30 de junho de 2011
29 de junho de 2011
Concordo, mas infelizmente...
«O acidente que provocou a morte do cantor Angélico Vieira tem um forte impacto imediato, sobretudo entre os mais jovens, mas não deverá ter um efeito pedagógico duradouro para a questão do cinto de segurança, defende um especialista.
Rui Carreteiro, psicólogo e coordenador de uma pós-graduação em Psicologia do Tráfego, acredita que o acidente, por ter envolvido uma jovem figura pública popular entre os mais jovens, vai salientar a importância do uso do cinto de segurança.
"Mas regra geral, neste tipo de situações, o impacto é muito forte, mas pouco duradouro. Terá um forte impacto imediato, não só nos fãs como na população em geral. Mas infelizmente o efeito pedagógico não será o desejado a médio longo prazo", afirma o especialista em declarações à agência Lusa.
Para Rui Carreteiro, nos próximos dias as pessoas terão mais cuidado e atenção ao uso do cinto, mas essa consequência tenderá a desaparecer com o tempo, ao ritmo da memória, que é curta.
"Quando há uma multa por excesso de velocidade, nos dias seguintes é-se muito cumpridor, mas passado algum tempo tudo volta o mesmo", compara, acrescentando que o ser humano é "um eterno tentador de ultrapassar os limites que são impostos pela sociedade".
(...)»
daqui: http://www.jn.pt/PaginaInicial/Media/Interior.aspx?content_id=1892161&page=1
Rui Carreteiro, psicólogo e coordenador de uma pós-graduação em Psicologia do Tráfego, acredita que o acidente, por ter envolvido uma jovem figura pública popular entre os mais jovens, vai salientar a importância do uso do cinto de segurança.
"Mas regra geral, neste tipo de situações, o impacto é muito forte, mas pouco duradouro. Terá um forte impacto imediato, não só nos fãs como na população em geral. Mas infelizmente o efeito pedagógico não será o desejado a médio longo prazo", afirma o especialista em declarações à agência Lusa.
Para Rui Carreteiro, nos próximos dias as pessoas terão mais cuidado e atenção ao uso do cinto, mas essa consequência tenderá a desaparecer com o tempo, ao ritmo da memória, que é curta.
"Quando há uma multa por excesso de velocidade, nos dias seguintes é-se muito cumpridor, mas passado algum tempo tudo volta o mesmo", compara, acrescentando que o ser humano é "um eterno tentador de ultrapassar os limites que são impostos pela sociedade".
(...)»
daqui: http://www.jn.pt/PaginaInicial/Media/Interior.aspx?content_id=1892161&page=1
28 de junho de 2011
17 de junho de 2011
estudar, estudar, estudar...
13 de junho de 2011
123º aniversário
«O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.»
Fernando António Nogueira Pessoa (Lisboa, 13 de Junho de 1888 — Lisboa, 30 de Novembro de 1935), mais conhecido como Fernando Pessoa, foi um poeta e escritor português.
É considerado um dos maiores poetas da Língua Portuguesa, e da Literatura Universal, muitas vezes comparado com Luís de Camões. O crítico literário Harold Bloom considerou a sua obra um "legado da língua portuguesa ao mundo".
Por ter crescido na África do Sul, para onde foi aos seis anos em virtude do casamento de sua mãe, Pessoa aprendeu a língua inglesa. Das quatro obras que publicou em vida, três são na língua inglesa. Fernando Pessoa dedicou-se também a traduções desse idioma.
Ao longo da vida trabalhou em várias firmas como correspondente comercial. Foi também empresário, editor, crítico literário, ativista político, tradutor, jornalista, inventor, publicitário e publicista, ao mesmo tempo que produzia a sua obra literária. Como poeta, desdobrou-se em múltiplas personalidades conhecidas como heterónimos, objeto da maior parte dos estudos sobre sua vida e sua obra. Centro irradiador da heteronímia, auto-denominou-se um "drama em gente".
Fernando Pessoa morreu de cirrose hepática aos 47 anos, na cidade onde nasceu. Sua última frase foi escrita em Inglês: "I know not what tomorrow will bring… " ("Não sei o que o amanhã trará").
in http://pt.wikipedia.org/wiki/Fernando_Pessoa
8 de junho de 2011
A palavra sobre a palavra
«Recebe-nos no seu gabinete, na Faculdade de Letras. Uma sala pequena, envelhecida, com muitos livros, muitos papéis - talvez por isso um espaço tão acolhedor. O cabelo que lhe emoldura o rosto está impecavelmente penteado. A blusa de linho, branca, bordada, acentua-lhe o ar distinto, o porte de gestos delicados.
(...)
Com tantas andanças pelo mundo, como é que o mundo vê a literatura portuguesa?
Com muito interesse, muita curiosidade! É pena que não haja mais e melhores traduções.
Era algo em que se devia investir a sério. Paulo Quintela era um grande tradutor, traduzia do Alemão, do Inglês e de outras línguas, mas sobretudo dessas. Traduzia excelentemente e dedicou toda a sua vida a essa tarefa, por vezes tendo sido criticado por isso. Diziam por aí que ele não tinha uma obra científica porque não escrevia livros, fazia apenas traduções e depois escrevia pequenas introduções para as traduções. Eu acho que ele fez um trabalho notável, pelo qual tenho um enorme respeito e admiração. Traduzir é muito difícil. Eu também já traduzi, ainda traduzo, e sei que é muito difícil. O interesse pela literatura portuguesa no estrangeiro é muito grande. E desde que o Saramago ganhou o Nobel, mais ainda.
E a nível da poesia, como estamos?
A poesia sempre foi algo que, de alguma forma, nos corre nas veias. Várias pessoas fizeram comentários sobre o facto de sermos um país de poetas. Acho que estamos bem representados. A Graça Capinha está a dirigir um projecto no Centro de Estudos Sociais (CES) - onde ambas somos investigadoras - sobre poesia. Ela chama-lhe Poéticas de Resistência. Esse projecto obriga-a a ir pelo país ver o que é que se publica que nunca chega ao Expresso nem ao Público. E ela diz que se faz imensa coisa muitíssimo boa que não chega aos meios de comunicação.
Há toda uma obra que fica completamente ignorada. Não tenho dúvidas: a literatura portuguesa está mesmo muito bem e recomenda-se.
Quem são os seus autores preferidos?
O Saramago é um deles. A Lídia Jorge também. Maria Velho da Costa. Ana Luísa Amaral.
Gosto muito do António Ramos Rosa e escrevi muito sobre ele. Mas o poeta vivo que mais admiro é o Alberto Pimenta. Muitas pessoas nem sequer ouviram falar dele. Ninguém fala muito nele porque ele é muito rebarbativo, mas é um grande poeta, que percebe que não se pode fazer igual ao que já foi feito. Depois há outros... A Fiama. Sophia, Eugénio de Andrade. O Herberto Hélder é outro grande poeta. Mas quando estes poetas começaram a publicar a sua “obra toda” ou “obra completa” o Alberto Pimenta publica um livro que intitula “Obra Quase Incompleta”! E essa obra é notável porque ele é capaz de publicar um poema a que, passados uns anos, caiem letras e fica com outro aspecto. É quase explicitamente uma reflexão sobre o problema da língua. Porque a língua é que é complicada. A língua fala-nos, não somos nós que falamos a língua. Eu tenho consciência de que a língua me está a falar neste momento, não sou eu que a falo.
O poeta é um fingidor?
Dizia o Pessoa, sim. No sentido do fingir, do fazer-de-conta da ficção - porque ficção e fingir são palavras cognatas – é verdade. Mas também temos de rever a questão da autenticidade.
O que Fernando Pessoa põe nesse poema é a questão da autenticidade: O fingimento é que é a verdadeira autenticidade. É o que diz verdadeiramente o mundo. Porque essa poesia de subjectividade de dizer o “eu” não é o mais importante. Aliás, Nietzsche dizia exactamente a mesma coisa: o que interessa é dizer o mundo, não o “eu”.
O poético também é político?
Sem dúvida. Tudo é. E mesmo aquele poeta que se diz apolítico tem a política do apoliticismo. Não há como escapar à nossa condição de seres políticos.
Mas a escrita foi uma arma de Abril.
Sem dúvida. Mas aquela que conseguiu contornar a censura, não aquela que ficou na gaveta.
Olhando para o Portugal de hoje acha que temos o país pelo qual Abril lutou?
Não, não acho.
O que é falta?
Falta mais justiça social. Falta... Eu até diria democracia. E há corrupção a mais. O 25 de Abril trouxe a democracia, sem dúvida; prometeu maior justiça social; e conseguiu algumas coisas, não vou dizer que não. Claro que sim. Agora, aquilo que muitos de nós pensávamos que ia ser o Portugal depois de Abril não se concretizou, pelo menos não na sua plenitude.
As mulheres ainda precisam que lutem por elas?
Elas é que precisam de lutar por elas. E cada vez mais creio que as mulheres estão a assumir essa luta de se afirmarem, de serem reconhecidas, de avançarem para posições de poder.
As mulheres ainda têm muitos e bons motivos para lutar. É preciso entendermos a nossa sociedade, a nossa cultura, as teorias pelas quais nos regemos. (...) É preciso continuar a lutar pelos direitos das mulheres, tal como é preciso continuar a lutar pelos direitos dos negros e das minorias. Em qualquer parte do mundo. Porque ainda há muito racismo e discriminação, por todo o lado.
As mulheres escrevem de forma diferente dos homens?
Já escrevi sobre isso. Desde que há consciência da escrita e do corpo que há produção escrita por mulheres que deliberadamente assumem que escrevem de forma diferente. Eu acho que não, acho que a arte e a literatura não são coisas naturais. Não há nada mais artificial que a poesia, nada mais artificial que a literatura, e portanto não é natural que se notem diferenças de uma escrita para a outra. A Irene Lisboa, uma grande poeta do modernismo português, dizia que distinguir a arte masculina da arte feminina é muito difícil. E é.
(...)
Para que é que serve a literatura e a poesia?
Para nada. (Silêncio) Para aprendermos a interrogar. Mas a poesia não diz nada. A poesia diz-se, não diz coisas. Diz-se. O mais importante da poesia e da arte em geral é, justamente, a gratuitidade. O gratuito é que faz de nós humanos. Aquilo que não é contabilizável, que não é objecto de imposto. Como diz o Álvaro de Campos: “Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?” [não me lembro agora bem do resto, mas a ideia é esta] queriam-me um homem normal? Não! Eu sou poeta!”. Mas os poetas são pessoas como as outras (sorriso).
São? Há aquela ideia de que são pessoas especiais...
Não. Isso é um conceito romântico e elitista que se mantém. É a ideia do génio. Mas porquê os poetas? Em qualquer outra área de actividade encontramos seres excepcionais. Não quer dizer que não existam poetas excepcionais. Mas a maior parte deles não o é. Como em tudo.
(...)
É uma mulher realizada?
Sempre a realizar. Sempre em realização.
O que é que ainda lhe falta fazer?
Morrer. Mas lá chegará (sorriso)...
(...)
É difícil vingar fora de Lisboa?
Só porque os jornais não nos ligam muito. O colóquio de estudos americanos que nós tivemos aqui intitulado “America where?”, um colóquio internacional, com especialistas americanos muitos bons, de topo; ex-presidentes da ASA – uma delas acaba de ser eleita presidente da associação. Da Irlanda, da Holanda, de Espanha, Inglaterra, Alemanha. Um naipe de especialistas dos melhores que há. Quem não veio, vergonhosamente, foram os nossos colegas americanistas de Lisboa e do Porto. Mas quem é que falou do colóquio? Por acaso, o António Guerreiro publicou o programa na Actual. Depois telefonou-me a dizer que não podia vir cobrir o colóquio porque o jornal não lhe dava espaço nenhum para este tema. Se fosse em Lisboa, se calhar as coisas seriam diferentes.
A poesia tem um papel social?
Claro. Aliás, tudo é social. Precisamente porque não tem de estar investida em interesses, a poesia tem uma função social importantíssima.
Num mundo que, como diz, “se desmorona”, mais do que mentir a poesia deve falar a verdade?
(Silêncio) A verdadeira poesia – e o meu mestre Bloom dizia “strong”, ou seja, “forte” – a grande poesia, “forte”, não mente. Nunca mente. Finge, mas não mente. São coisas diferentes.
Se quando fala em verdade me fala de poesia-panfleto, isso não! Poesia não é panfleto.
Se é, deixa de ser poesia. Agora, a poesia tem muitas maneiras de dizer as coisas. O Robert Duncan, que era ferozmente contra a Guerra do Vietnam, escreveu vários poemas em que se posicionava contra a guerra, mas fê-lo de forma a que a verdade dele estivesse lá sem cair no panfletário.
Prefere poesia ou literatura?
Fernando Pessoa e Sá Carneiro faziam essa distinção e diziam que só os lepidópteros apreciavam a literatura, os outros preferiam poesia. A poesia é a arte suprema da linguagem. E, nesse sentido, acho que prefiro a poesia – sem a distinguir da literatura, nem da ficção, nem do drama.
A poesia é esquecimento ou memória?
As duas coisas. Há um poema de Hart Crane, outro dos meus poetas preferidos, que diz “I can remember much forgetfulness”. É muito bonito. Nós agora temos um projecto no CES, que esperamos que venha a ser aprovado, sobre o silêncio e os silenciamentos. A minha parte vai ser justamente sobre a poesia e os silêncios e os silenciamentos da poesia. E os esquecimentos, porque o esquecimento também é um silêncio.
O belo ou o feio?
As duas coisas. Aliás, uma não existe sem a outra. É o chamado sublime.
Alberto Caeiro, Ricardo Reis ou Álvaro de Campos?
Fernando Pessoa.
Qual é a sua palavra preferida?
A minha palavra preferida? (Silêncio) Que linda pergunta! É “poesia”.
Diga-me o título de um livro que a fez feliz e de um livro que a fez chorar.
Há um livro que ainda está muito presente em mim. É um belíssimo romance. “Myra”, de Maria Velho da Costa. Fez-me chorar e também me fez feliz porque é uma bela obra.
A Língua Portuguesa é a Língua mais bonita do mundo?
Não.
Qual é?
Não sei... »
mais aqui: http://www.uc.pt/rualarga/anteriores/26/26_17
* Maria Irene Ramalho é licenciada pela Universidade de Coimbra e doutorada pela Universidade de Yale. É professora de Estudos Ingleses e Americanos da Universidade de Coimbra e International Affiliate do Departamento de Literatura Comparada da Universidade de Wisconsin-Madison. Foi, em 2008, galardoada nos Estados Unidos com o Prémio Mary C. Turpie atribuído pela mais importante associação de estudos americanos (American Studies Association), que pela primeira vez é atribuído a alguém de fora do país.
(...)
Com tantas andanças pelo mundo, como é que o mundo vê a literatura portuguesa?
Com muito interesse, muita curiosidade! É pena que não haja mais e melhores traduções.
Era algo em que se devia investir a sério. Paulo Quintela era um grande tradutor, traduzia do Alemão, do Inglês e de outras línguas, mas sobretudo dessas. Traduzia excelentemente e dedicou toda a sua vida a essa tarefa, por vezes tendo sido criticado por isso. Diziam por aí que ele não tinha uma obra científica porque não escrevia livros, fazia apenas traduções e depois escrevia pequenas introduções para as traduções. Eu acho que ele fez um trabalho notável, pelo qual tenho um enorme respeito e admiração. Traduzir é muito difícil. Eu também já traduzi, ainda traduzo, e sei que é muito difícil. O interesse pela literatura portuguesa no estrangeiro é muito grande. E desde que o Saramago ganhou o Nobel, mais ainda.
E a nível da poesia, como estamos?
A poesia sempre foi algo que, de alguma forma, nos corre nas veias. Várias pessoas fizeram comentários sobre o facto de sermos um país de poetas. Acho que estamos bem representados. A Graça Capinha está a dirigir um projecto no Centro de Estudos Sociais (CES) - onde ambas somos investigadoras - sobre poesia. Ela chama-lhe Poéticas de Resistência. Esse projecto obriga-a a ir pelo país ver o que é que se publica que nunca chega ao Expresso nem ao Público. E ela diz que se faz imensa coisa muitíssimo boa que não chega aos meios de comunicação.
Há toda uma obra que fica completamente ignorada. Não tenho dúvidas: a literatura portuguesa está mesmo muito bem e recomenda-se.
Quem são os seus autores preferidos?
O Saramago é um deles. A Lídia Jorge também. Maria Velho da Costa. Ana Luísa Amaral.
Gosto muito do António Ramos Rosa e escrevi muito sobre ele. Mas o poeta vivo que mais admiro é o Alberto Pimenta. Muitas pessoas nem sequer ouviram falar dele. Ninguém fala muito nele porque ele é muito rebarbativo, mas é um grande poeta, que percebe que não se pode fazer igual ao que já foi feito. Depois há outros... A Fiama. Sophia, Eugénio de Andrade. O Herberto Hélder é outro grande poeta. Mas quando estes poetas começaram a publicar a sua “obra toda” ou “obra completa” o Alberto Pimenta publica um livro que intitula “Obra Quase Incompleta”! E essa obra é notável porque ele é capaz de publicar um poema a que, passados uns anos, caiem letras e fica com outro aspecto. É quase explicitamente uma reflexão sobre o problema da língua. Porque a língua é que é complicada. A língua fala-nos, não somos nós que falamos a língua. Eu tenho consciência de que a língua me está a falar neste momento, não sou eu que a falo.
O poeta é um fingidor?
Dizia o Pessoa, sim. No sentido do fingir, do fazer-de-conta da ficção - porque ficção e fingir são palavras cognatas – é verdade. Mas também temos de rever a questão da autenticidade.
O que Fernando Pessoa põe nesse poema é a questão da autenticidade: O fingimento é que é a verdadeira autenticidade. É o que diz verdadeiramente o mundo. Porque essa poesia de subjectividade de dizer o “eu” não é o mais importante. Aliás, Nietzsche dizia exactamente a mesma coisa: o que interessa é dizer o mundo, não o “eu”.
O poético também é político?
Sem dúvida. Tudo é. E mesmo aquele poeta que se diz apolítico tem a política do apoliticismo. Não há como escapar à nossa condição de seres políticos.
Mas a escrita foi uma arma de Abril.
Sem dúvida. Mas aquela que conseguiu contornar a censura, não aquela que ficou na gaveta.
Olhando para o Portugal de hoje acha que temos o país pelo qual Abril lutou?
Não, não acho.
O que é falta?
Falta mais justiça social. Falta... Eu até diria democracia. E há corrupção a mais. O 25 de Abril trouxe a democracia, sem dúvida; prometeu maior justiça social; e conseguiu algumas coisas, não vou dizer que não. Claro que sim. Agora, aquilo que muitos de nós pensávamos que ia ser o Portugal depois de Abril não se concretizou, pelo menos não na sua plenitude.
As mulheres ainda precisam que lutem por elas?
Elas é que precisam de lutar por elas. E cada vez mais creio que as mulheres estão a assumir essa luta de se afirmarem, de serem reconhecidas, de avançarem para posições de poder.
As mulheres ainda têm muitos e bons motivos para lutar. É preciso entendermos a nossa sociedade, a nossa cultura, as teorias pelas quais nos regemos. (...) É preciso continuar a lutar pelos direitos das mulheres, tal como é preciso continuar a lutar pelos direitos dos negros e das minorias. Em qualquer parte do mundo. Porque ainda há muito racismo e discriminação, por todo o lado.
As mulheres escrevem de forma diferente dos homens?
Já escrevi sobre isso. Desde que há consciência da escrita e do corpo que há produção escrita por mulheres que deliberadamente assumem que escrevem de forma diferente. Eu acho que não, acho que a arte e a literatura não são coisas naturais. Não há nada mais artificial que a poesia, nada mais artificial que a literatura, e portanto não é natural que se notem diferenças de uma escrita para a outra. A Irene Lisboa, uma grande poeta do modernismo português, dizia que distinguir a arte masculina da arte feminina é muito difícil. E é.
(...)
Para que é que serve a literatura e a poesia?
Para nada. (Silêncio) Para aprendermos a interrogar. Mas a poesia não diz nada. A poesia diz-se, não diz coisas. Diz-se. O mais importante da poesia e da arte em geral é, justamente, a gratuitidade. O gratuito é que faz de nós humanos. Aquilo que não é contabilizável, que não é objecto de imposto. Como diz o Álvaro de Campos: “Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?” [não me lembro agora bem do resto, mas a ideia é esta] queriam-me um homem normal? Não! Eu sou poeta!”. Mas os poetas são pessoas como as outras (sorriso).
São? Há aquela ideia de que são pessoas especiais...
Não. Isso é um conceito romântico e elitista que se mantém. É a ideia do génio. Mas porquê os poetas? Em qualquer outra área de actividade encontramos seres excepcionais. Não quer dizer que não existam poetas excepcionais. Mas a maior parte deles não o é. Como em tudo.
(...)
É uma mulher realizada?
Sempre a realizar. Sempre em realização.
O que é que ainda lhe falta fazer?
Morrer. Mas lá chegará (sorriso)...
(...)
É difícil vingar fora de Lisboa?
Só porque os jornais não nos ligam muito. O colóquio de estudos americanos que nós tivemos aqui intitulado “America where?”, um colóquio internacional, com especialistas americanos muitos bons, de topo; ex-presidentes da ASA – uma delas acaba de ser eleita presidente da associação. Da Irlanda, da Holanda, de Espanha, Inglaterra, Alemanha. Um naipe de especialistas dos melhores que há. Quem não veio, vergonhosamente, foram os nossos colegas americanistas de Lisboa e do Porto. Mas quem é que falou do colóquio? Por acaso, o António Guerreiro publicou o programa na Actual. Depois telefonou-me a dizer que não podia vir cobrir o colóquio porque o jornal não lhe dava espaço nenhum para este tema. Se fosse em Lisboa, se calhar as coisas seriam diferentes.
A poesia tem um papel social?
Claro. Aliás, tudo é social. Precisamente porque não tem de estar investida em interesses, a poesia tem uma função social importantíssima.
Num mundo que, como diz, “se desmorona”, mais do que mentir a poesia deve falar a verdade?
(Silêncio) A verdadeira poesia – e o meu mestre Bloom dizia “strong”, ou seja, “forte” – a grande poesia, “forte”, não mente. Nunca mente. Finge, mas não mente. São coisas diferentes.
Se quando fala em verdade me fala de poesia-panfleto, isso não! Poesia não é panfleto.
Se é, deixa de ser poesia. Agora, a poesia tem muitas maneiras de dizer as coisas. O Robert Duncan, que era ferozmente contra a Guerra do Vietnam, escreveu vários poemas em que se posicionava contra a guerra, mas fê-lo de forma a que a verdade dele estivesse lá sem cair no panfletário.
Prefere poesia ou literatura?
Fernando Pessoa e Sá Carneiro faziam essa distinção e diziam que só os lepidópteros apreciavam a literatura, os outros preferiam poesia. A poesia é a arte suprema da linguagem. E, nesse sentido, acho que prefiro a poesia – sem a distinguir da literatura, nem da ficção, nem do drama.
A poesia é esquecimento ou memória?
As duas coisas. Há um poema de Hart Crane, outro dos meus poetas preferidos, que diz “I can remember much forgetfulness”. É muito bonito. Nós agora temos um projecto no CES, que esperamos que venha a ser aprovado, sobre o silêncio e os silenciamentos. A minha parte vai ser justamente sobre a poesia e os silêncios e os silenciamentos da poesia. E os esquecimentos, porque o esquecimento também é um silêncio.
O belo ou o feio?
As duas coisas. Aliás, uma não existe sem a outra. É o chamado sublime.
Alberto Caeiro, Ricardo Reis ou Álvaro de Campos?
Fernando Pessoa.
Qual é a sua palavra preferida?
A minha palavra preferida? (Silêncio) Que linda pergunta! É “poesia”.
Diga-me o título de um livro que a fez feliz e de um livro que a fez chorar.
Há um livro que ainda está muito presente em mim. É um belíssimo romance. “Myra”, de Maria Velho da Costa. Fez-me chorar e também me fez feliz porque é uma bela obra.
A Língua Portuguesa é a Língua mais bonita do mundo?
Não.
Qual é?
Não sei... »
mais aqui: http://www.uc.pt/rualarga/anteriores/26/26_17
* Maria Irene Ramalho é licenciada pela Universidade de Coimbra e doutorada pela Universidade de Yale. É professora de Estudos Ingleses e Americanos da Universidade de Coimbra e International Affiliate do Departamento de Literatura Comparada da Universidade de Wisconsin-Madison. Foi, em 2008, galardoada nos Estados Unidos com o Prémio Mary C. Turpie atribuído pela mais importante associação de estudos americanos (American Studies Association), que pela primeira vez é atribuído a alguém de fora do país.
7 de junho de 2011
5 de junho de 2011
A vida humana
«Se te dizem que faças o que quiseres, a primeira coisa que parece aconselhável é que penses com tempo e a fundo o que é aquilo que queres. Apetecem-te com certeza muitas coisas, amiúde contraditórias, como acontece com toda a gente: queres ter uma moto, mas não queres partir a cabeça no asfalto, queres ter amigos, mas sem perderes a tua independência, queres ter dinheiro, mas não queres sujeitar-te ao próximo para o conseguires, queres saber coisas e por isso compreendes que é preciso estudar, mas também queres divertir-te, queres que eu não te chateie e te deixe viver à tua maneira, mas também que esteja presente para te ajudar quando necessitas disso, etc. Numa palavra, se tivesses que resumir tudo isto e pôr sinceramente em palavras o teu desejo global e mais profundo, dir-me-ias: «Olha, pai, o que eu quero é ter uma vida boa.» Bravo! O prémio para este senhor! Era isso mesmo o meu conselho: quando te disse «faz o que quiseres», o que, no fundo, pretendia recomendar-te é que tivesses o atrevimento de teres uma vida boa. (…)
Queres ter uma vida boa: magnífico. Mas também queres que essa vida boa não seja a vida boa de uma couve-flor ou de um escaravelho, com todo o respeito que tenho por ambas as espécies, mas uma vida humana boa. É o que te interessa, creio eu. E tenho a certeza de que não renunciarias a isso por nada deste mundo. Ser-se humano, já o vimos antes, consiste principalmente em ter relações com outros seres humanos. Se pudesses ter muito, muito dinheiro, uma casa mais sumptuosa do que um palácio das mil e uma noites, as melhores roupas, os alimentos mais requintados (…), as aparelhagens mais perfeitas, etc., mas tudo isso à custa de não voltares a ver nem a ser visto – nunca – por um outro ser humano, ficarias satisfeito? Quanto tempo poderias viver assim sem te tornares louco? Não será a maior das loucuras querermos as coisas à custa da relação com as pessoas? Mas se justamente a graça de todas as coisas de que falámos assenta no facto de te permitirem – ou parecerem permitir – relacionares-te mais favoravelmente com os outros! (…) Muito poucas coisas conservam a sua graça na solidão; e se a solidão for completa e definitiva, todas as coisas se volvem irremediavelmente amargas. A vida humana boa é vida boa entre seres humanos ou, caso contrário, pode ser que seja ainda vida, mas não será nem boa nem humana.»
Queres ter uma vida boa: magnífico. Mas também queres que essa vida boa não seja a vida boa de uma couve-flor ou de um escaravelho, com todo o respeito que tenho por ambas as espécies, mas uma vida humana boa. É o que te interessa, creio eu. E tenho a certeza de que não renunciarias a isso por nada deste mundo. Ser-se humano, já o vimos antes, consiste principalmente em ter relações com outros seres humanos. Se pudesses ter muito, muito dinheiro, uma casa mais sumptuosa do que um palácio das mil e uma noites, as melhores roupas, os alimentos mais requintados (…), as aparelhagens mais perfeitas, etc., mas tudo isso à custa de não voltares a ver nem a ser visto – nunca – por um outro ser humano, ficarias satisfeito? Quanto tempo poderias viver assim sem te tornares louco? Não será a maior das loucuras querermos as coisas à custa da relação com as pessoas? Mas se justamente a graça de todas as coisas de que falámos assenta no facto de te permitirem – ou parecerem permitir – relacionares-te mais favoravelmente com os outros! (…) Muito poucas coisas conservam a sua graça na solidão; e se a solidão for completa e definitiva, todas as coisas se volvem irremediavelmente amargas. A vida humana boa é vida boa entre seres humanos ou, caso contrário, pode ser que seja ainda vida, mas não será nem boa nem humana.»
Fernando Savater, Ética para um Jovem,
7.ª ed., trad. Miguel Serras Pereira, Lisboa, Presença, 2000
7.ª ed., trad. Miguel Serras Pereira, Lisboa, Presença, 2000
4 de junho de 2011
O sol faz bem!
«Nesta época estival voltamos a ouvir falar insistentemente dos malefícios do sol, mas a verdade é que o sol também faz bem e é fundamental para a nossa saúde. Assumindo que toda a gente já sabe quais as melhores horas para se expor ao sol e como se deve proteger, vamos lembrar quais os seus benefícios.
* O sol é essencial para a sintetização da vitamina D, responsável pela formação do cálcio e pela fixação do mesmo nos ossos e dentes. No entanto, 5 a 10 minutos de sol por dia, duas vezes por semana, são suficientes.
* Quando a luz entra em contacto com a retina, ativa a glândula pineal (que controla os biorritmos do corpo), inibindo a produção de melatonina e permitindo a libertação de serotonima, o que ajuda a levantar o ânimo e a combater a depressão.
* Já ouviu dizer: "Na primavera, o sangue altera"? Isto tem a ver com o aumento do calor e das horas de sol, que melhoram a circulação sanguínea e nos dão a sensação de ter mais energia, entre outras coisas.
* Estimula o sistema endócrino, melhorando o metabolismo e promovendo a absorção das vitaminas, proteínas e minerais.
* Ajuda a combater o acne e curar as infeções por fungos.
* Fortalece o sistema imunitário, promovendo o aumento dos glóbulos brancos.
* Aumenta a concentração de glóbulos vermelhos, que transportam o oxigénio aos tecidos.
* O sol também regula a leptina, hormona que envia o sinal de saciedade ao cérebro. Por isso no verão sentimos menos fome.
* A pele bronzeada ganha outro brilho e fica com um aspeto mais saudável. Com isto, a autoestima e a sensação de bem-estar aumentam consideravelmente.»
* O sol é essencial para a sintetização da vitamina D, responsável pela formação do cálcio e pela fixação do mesmo nos ossos e dentes. No entanto, 5 a 10 minutos de sol por dia, duas vezes por semana, são suficientes.
* Quando a luz entra em contacto com a retina, ativa a glândula pineal (que controla os biorritmos do corpo), inibindo a produção de melatonina e permitindo a libertação de serotonima, o que ajuda a levantar o ânimo e a combater a depressão.
* Já ouviu dizer: "Na primavera, o sangue altera"? Isto tem a ver com o aumento do calor e das horas de sol, que melhoram a circulação sanguínea e nos dão a sensação de ter mais energia, entre outras coisas.
* Estimula o sistema endócrino, melhorando o metabolismo e promovendo a absorção das vitaminas, proteínas e minerais.
* Ajuda a combater o acne e curar as infeções por fungos.
* Fortalece o sistema imunitário, promovendo o aumento dos glóbulos brancos.
* Aumenta a concentração de glóbulos vermelhos, que transportam o oxigénio aos tecidos.
* O sol também regula a leptina, hormona que envia o sinal de saciedade ao cérebro. Por isso no verão sentimos menos fome.
* A pele bronzeada ganha outro brilho e fica com um aspeto mais saudável. Com isto, a autoestima e a sensação de bem-estar aumentam consideravelmente.»
3 de junho de 2011
"Olhó' gelado gigante"
2 de junho de 2011
Nova escrita
Li numa revista o seguinte artigo:
«O uso das novas regras de ortografia só passa a ser obrigatório a partir de 2012. (...) De seguida, apresentamos-lhe algumas destas alterações:
- As letras "k", "w" e "y" são integradas no alfabeto.
- Os meses, as estações do ano e os pontos cardeais passam a escrever-se com minúsculas:
* janeiro, fevereiro, março, etc.
* primavera, verão, outono e inverno.
* norte, sul, este, oeste, noroeste, etc.
- Suprimem-se alguns acentos, como por exemplo:
* nas palavras graves com acento tónico "oi": boia, joia, heroico, etc.
* nas formas verbais graves terminadas em "eem": veem, deem, creem, etc.
* nas palavras graves homógrafas: pelo, pera, para, etc.
- Desaparecem as consoantes mudas e mantêm-se as que as pronunciam:
* Desaparecem: colecionar, ação, coletivo, ator, objetivo, projeto, etc.
* Mantêm-se: facto, ficção, convicção, bactéria, néctar, etc.
- O hífen desaparece:
* Nas formas monossilábicos do verbo Haver com a preposição de: hei de, hás de, hão de, etc.
* Nas palavras compostas que entretanto se tornaram uma, ou cujas letras anteriores e posteriores são a mesma consoante ou consoantes e vogais diferentes: mandachuva, paraquedas, contrassenso, antirrugas, autoestrada, extraescolar, etc.
* Nas locuções de uso geral (exceto as que designam espécies botânicas ou zoológicas): fim de semana, mesa de cabeceira, andorinha-do-mar, feijão frade, etc.»
«O uso das novas regras de ortografia só passa a ser obrigatório a partir de 2012. (...) De seguida, apresentamos-lhe algumas destas alterações:
- As letras "k", "w" e "y" são integradas no alfabeto.
- Os meses, as estações do ano e os pontos cardeais passam a escrever-se com minúsculas:
* janeiro, fevereiro, março, etc.
* primavera, verão, outono e inverno.
* norte, sul, este, oeste, noroeste, etc.
- Suprimem-se alguns acentos, como por exemplo:
* nas palavras graves com acento tónico "oi": boia, joia, heroico, etc.
* nas formas verbais graves terminadas em "eem": veem, deem, creem, etc.
* nas palavras graves homógrafas: pelo, pera, para, etc.
- Desaparecem as consoantes mudas e mantêm-se as que as pronunciam:
* Desaparecem: colecionar, ação, coletivo, ator, objetivo, projeto, etc.
* Mantêm-se: facto, ficção, convicção, bactéria, néctar, etc.
- O hífen desaparece:
* Nas formas monossilábicos do verbo Haver com a preposição de: hei de, hás de, hão de, etc.
* Nas palavras compostas que entretanto se tornaram uma, ou cujas letras anteriores e posteriores são a mesma consoante ou consoantes e vogais diferentes: mandachuva, paraquedas, contrassenso, antirrugas, autoestrada, extraescolar, etc.
* Nas locuções de uso geral (exceto as que designam espécies botânicas ou zoológicas): fim de semana, mesa de cabeceira, andorinha-do-mar, feijão frade, etc.»
1 de junho de 2011
29 de maio de 2011
25 de maio de 2011
Cantigas de Amigo
Sedia-m'eu na ermida de San Simion
e cercaron-mi as ondas que grandes son:
eu atendo'o meu amigo,
eu atend'o meu amigo.
Estando na ermida ant'o altar,
cercaron-mi as ondas grandes do mar;
eu atend'o meu amigo,
eu atend'o meu amigo.
E cercaron-mi as ondas que grandes son:
nem hei i barqueiro nem remador;
eu atend'o meu amigo,
eu atend'o meu amigo.
E cercaron-mi as ondas do alto mar;
non hei i barqueiro nem sei remar;
eu atend'o meu amigo,
eu atend'o meu amigo.
Non hei i barqueiro nem remador:
morrerei eu, fremosa, no mar maior:
eu atend'o meu amigo,
eu atend'o meu amigo.
Nem hei i barqueiro nem sei remar,
e morrerei eu, fremosa, no alto mar:
eu atend'0 meu amigo,
eu atend'o meu amigo.
Meendinho
«Ao lermos as cantigas de amigo, género lírico da tradição medieval galego-portuguesa, fitamos um difuso simbolismo esotérico feito de uma coincidência entre sentimento e ambiente, como por exemplo: “Amor = natureza alegremente faladora (Primavera) / indiferença = natureza tristemente silenciosa (Inverno)”.
Algumas destas cantigas têm a forma de diálogo de uma rapariga enamorada com a mãe, ou a irmã, ou as amigas, sempre acerca do “amigo” ou com este mesmo. Outras são monólogos de uma mulher enamorada. O lirismo vazado nestas composições tanto versa sobre o amor não correspondido, causa de sofrimento, desconforto e lamento, como também pode ser manifestação de um amor espontâneo. Assim, são diversos os sentimentos da donzela: o amor tranquilo e alegre; o fervor da paixão; a ansiedade e angústia porque o amigo não dá notícias; as saudades e a tristeza pela ausência do amado; os ciúmes ou as promessas de vingança pela infidelidade do amigo…
Não é por acaso que Amália Rodrigues utilizou a letra da cantiga “Sedia-m’eu na ermida de Sam Simiom” num fado. Neste cantar de amigo, a donzela, na ermida de S. Simão (ilhéu da ria de Vigo), espera o amigo embarcado. Desesperada, vê a maré encher, crescendo a sua angústia ao pensar que vai morrer sem encontrar o amigo.»
e cercaron-mi as ondas que grandes son:
eu atendo'o meu amigo,
eu atend'o meu amigo.
Estando na ermida ant'o altar,
cercaron-mi as ondas grandes do mar;
eu atend'o meu amigo,
eu atend'o meu amigo.
E cercaron-mi as ondas que grandes son:
nem hei i barqueiro nem remador;
eu atend'o meu amigo,
eu atend'o meu amigo.
E cercaron-mi as ondas do alto mar;
non hei i barqueiro nem sei remar;
eu atend'o meu amigo,
eu atend'o meu amigo.
Non hei i barqueiro nem remador:
morrerei eu, fremosa, no mar maior:
eu atend'o meu amigo,
eu atend'o meu amigo.
Nem hei i barqueiro nem sei remar,
e morrerei eu, fremosa, no alto mar:
eu atend'0 meu amigo,
eu atend'o meu amigo.
Meendinho
«Ao lermos as cantigas de amigo, género lírico da tradição medieval galego-portuguesa, fitamos um difuso simbolismo esotérico feito de uma coincidência entre sentimento e ambiente, como por exemplo: “Amor = natureza alegremente faladora (Primavera) / indiferença = natureza tristemente silenciosa (Inverno)”.
Algumas destas cantigas têm a forma de diálogo de uma rapariga enamorada com a mãe, ou a irmã, ou as amigas, sempre acerca do “amigo” ou com este mesmo. Outras são monólogos de uma mulher enamorada. O lirismo vazado nestas composições tanto versa sobre o amor não correspondido, causa de sofrimento, desconforto e lamento, como também pode ser manifestação de um amor espontâneo. Assim, são diversos os sentimentos da donzela: o amor tranquilo e alegre; o fervor da paixão; a ansiedade e angústia porque o amigo não dá notícias; as saudades e a tristeza pela ausência do amado; os ciúmes ou as promessas de vingança pela infidelidade do amigo…
Não é por acaso que Amália Rodrigues utilizou a letra da cantiga “Sedia-m’eu na ermida de Sam Simiom” num fado. Neste cantar de amigo, a donzela, na ermida de S. Simão (ilhéu da ria de Vigo), espera o amigo embarcado. Desesperada, vê a maré encher, crescendo a sua angústia ao pensar que vai morrer sem encontrar o amigo.»
24 de maio de 2011
O Doido e a Morte
«GOVERNADOR CIVIL - Perdão, Sr. Milhões. É preciso que atenda a várias circunstâncias pessoais. Eu não estou preparado para morrer. Não se morre assim sem mais nem menos. Morrer! Morrer!. . . Então o senhor pensa que isto de morrer é uma coisa sem importância nenhuma? Morrer é uma coisa muito séria, é um acto que importa certa preparação, testamento, cólicas, etc. É só chegar aqui, morrer e mais nada! Que tal está o da rabeca! Morrer! Eu não quero morrer nem pensei nunca a sério que tivesse de morrer. Tenho ido a enterros, mas é aos dos outros. . . Então o senhor entra-me pela porta dentro, e sem mais nem ontem, de repente, fala-me assim de morrer como se eu fosse um condenado à morte, nas escadas da força? Adeus, meu amigo! Além disso, é um crime. Previno-o de que é um crime, punido por todos os códigos, atentar contra a vida duma autoridade constituída, demais a mais no exercício das suas funções. Artigo 343. o do Código Penal. Vamos, vamos. . . Isso é um momento de desvario e mais nada. Espero que as minhas palavras o façam reconsiderar. (O outro ergue-se implacável e aproxima a mão da campainha.) Ai que ele está doido varrido! (Exaltando-se) Senhor! Senhor! (Avança para o agarrar, mas o outro põe o dedo em cima do botão e ele afasta-se logo.)
(...)
SR. MILHÕES - Doido! Doido!. . . Já é com esta a terceira vez que mo chama. Saiba então que um homem que não tem aos menos uma parcela de loucura não presta para nada. Aqui estou eu, que, enquanto tive o meu juízo todo, nunca fui feliz. (O Governador Civil julgando-o descuidado, vai-se aproximando da porta.) Passar por doido tem muitas vantagens. Direi mesmo que é a única situação vantajosa que há neste país. O doido diz tudo quanto lhe passa pela cabeça. (E continuando a falar imperturbável faz-lhe sinal que volte para trás e aproxima o dedo da campainha.) Ninguém estranha. O doido pode andar de chinelos de ourelo pelo Chiado. Ninguém repara. Quem tem juízo vive constrangido e está sujeito a mil complicações. Vá, sente-se.»
Editado em 1923. O Doido e a Morte, elogiado por José Régio e Miguel Torga é, porventura, a melhor obra de Raul Brandão e reveste-se de enorme relevo no panorama teatral português. A acção de "O Doido e a Morte" desenvolve-se num contexto marcado pela degradação da vida social e política da República. Em cena, entre outras personagens, dois indivíduos que o autor transformou em arqui-rivais: um governador civil e um milionário alegadamente enlouquecido. Perante a morte iminente estas personagens, "abrem o livro" e fazem uma breve resenha do que é que vale a pena recordar na esterelidade que assola duas vidas inúteis...
(...)
SR. MILHÕES - Doido! Doido!. . . Já é com esta a terceira vez que mo chama. Saiba então que um homem que não tem aos menos uma parcela de loucura não presta para nada. Aqui estou eu, que, enquanto tive o meu juízo todo, nunca fui feliz. (O Governador Civil julgando-o descuidado, vai-se aproximando da porta.) Passar por doido tem muitas vantagens. Direi mesmo que é a única situação vantajosa que há neste país. O doido diz tudo quanto lhe passa pela cabeça. (E continuando a falar imperturbável faz-lhe sinal que volte para trás e aproxima o dedo da campainha.) Ninguém estranha. O doido pode andar de chinelos de ourelo pelo Chiado. Ninguém repara. Quem tem juízo vive constrangido e está sujeito a mil complicações. Vá, sente-se.»
Editado em 1923. O Doido e a Morte, elogiado por José Régio e Miguel Torga é, porventura, a melhor obra de Raul Brandão e reveste-se de enorme relevo no panorama teatral português. A acção de "O Doido e a Morte" desenvolve-se num contexto marcado pela degradação da vida social e política da República. Em cena, entre outras personagens, dois indivíduos que o autor transformou em arqui-rivais: um governador civil e um milionário alegadamente enlouquecido. Perante a morte iminente estas personagens, "abrem o livro" e fazem uma breve resenha do que é que vale a pena recordar na esterelidade que assola duas vidas inúteis...
23 de maio de 2011
Ausência
Num deserto sem água
Numa noite sem lua
Num país sem nome
Ou numa terra nua
Por maior que seja o desespero
Nenhuma ausência é mais funda do que a tua.
Sophia de Mello Breyner Andresen
Numa noite sem lua
Num país sem nome
Ou numa terra nua
Por maior que seja o desespero
Nenhuma ausência é mais funda do que a tua.
Sophia de Mello Breyner Andresen
20 de maio de 2011
Luís de Camões tapado com um pano preto
«Ao fazer o meu passeio diário de bicicleta de Matosinhos à Foz, no Porto, deparei-me, no pequeno largo junto à Praia dos Ingleses, com o busto de Luís de Camões tapado com um pano preto e onde estava escrita a palavra "vergonha" em caracteres grandes. Curioso!
Esta iniciativa já não é original, dado que no final do séc.XIX, por altura do Ultimatum inglês, o povo de Lisboa tapou a estátua de Luís de Camões com panos pretos, tal era a vergonha pela "cobardia" dos nossos políticos perante os tais ditos "aliados" ingleses!»
Pedro Santos da Cunha
in http://www.jn.pt/CidadaoReporter/Interior.aspx?content_id=1845945
Esta iniciativa já não é original, dado que no final do séc.XIX, por altura do Ultimatum inglês, o povo de Lisboa tapou a estátua de Luís de Camões com panos pretos, tal era a vergonha pela "cobardia" dos nossos políticos perante os tais ditos "aliados" ingleses!»
Pedro Santos da Cunha
in http://www.jn.pt/CidadaoReporter/Interior.aspx?content_id=1845945
19 de maio de 2011
14 de maio de 2011
13 de maio de 2011
prémio Camões
Agora é diferente
Tenho o teu nome o teu cheiro
A minha roupa de repente
ficou com o teu cheiro
Agora estamos misturados
No meio de nós já não cabe o amor
Já não arranjamos
lugar para o amor
Já não arranjamos vagar
para o amor agora
isto vai devagar
isto agora demora
Manuel António Pina (1943)
Sabugal (Portugal)
«Em menos de meia hora o júri chegou a uma decisão consensual: Manuel António Pina é o vencedor do Prémio Camões 2011. Apesar de tão óbvia, a decisão apanhou o escritor desprevenido. "Foi a coisa mais inesperada que eu poderia esperar. Nem sabia que o júri estava reunido, nem que o prémio ia ser atribuído hoje. Portanto, fiquei absolutamente surpreendido", disse ontem à Lusa. O júri distinguiu a obra de Pina pela sua "inventividade e a originalidade". "Sinto-me um bocado embaraçado, atendendo à qualidade das pessoas, ao Panteão a quem já foi atribuído anteriormente o prémio", disse o escritor.
Com 67 anos, o jornalista do Sabugal, licenciado em direito, dividiu-se por várias áreas da literatura. O homem dos quatro ofícios: poesia, teatro, literatura infantil e ficção.
Em 1973 editava o seu primeiro livro: "O País das Pessoas de Pernas para o Ar". Como o título indica trata-se de um livro infantil que explora um lado mais surreal e humorístico, como no conto do menino Jesus não queria ser Deus. A sua obra infantil rompeu com a tradição e já faz parte dela, ao ser incluído no Plano Nacional da Leitura. Em 1974, Manuel António Pinta lançava-se na poesia com "Ainda Não É o Fim nem o Princípio do Mundo Calma É Apenas Um Pouco Tarde". "Acaba por ser também um prémio dado à poesia, que faz todo o sentido, porque continuamos a ser um país de grandíssimos valores nessa área e com um reconhecimento que é sempre justo e positivo", afirmou José Luís Peixoto à Lusa. Mário Cláudio concorda e defende que premiar a poesia é importante, pois tem estado mais esquecida.
Manuel António Pina ainda escreveu para teatro, sendo "História do sábio fechado na sua biblioteca", a sua última peça. O nome do escritor está associado à história do jornalismo. "Inovou muito no jornalismo português. Deu alma às notícias, com uma abordagem mais poética, mais livre", defendeu o historiador Germano Silva.
Em 2003, Pina deixou o terreno mais que familiar da literatura infantil e aventurou-se na ficção para pessoas mais crescidas com "Os Papéis de K.". A sua obra está traduzida em França, em Espanha, na Dinamarca, na Alemanha, na Rússia, na Croácia, na Bulgária e nos Estados Unidos. O Brasil parece ser a próxima aposta, já que os trabalhos do poeta ainda não foram publicados na terra do samba. Pina é o 10º português a receber o prémio. No ano passado, o Camões, no valor de 100 mil euros, foi para o poeta brasileiro Ferreira Gullar. O primeiro vencedor do Prémio foi Miguel Torga, em 1989.»
Tenho o teu nome o teu cheiro
A minha roupa de repente
ficou com o teu cheiro
Agora estamos misturados
No meio de nós já não cabe o amor
Já não arranjamos
lugar para o amor
Já não arranjamos vagar
para o amor agora
isto vai devagar
isto agora demora
Manuel António Pina (1943)
Sabugal (Portugal)
«Em menos de meia hora o júri chegou a uma decisão consensual: Manuel António Pina é o vencedor do Prémio Camões 2011. Apesar de tão óbvia, a decisão apanhou o escritor desprevenido. "Foi a coisa mais inesperada que eu poderia esperar. Nem sabia que o júri estava reunido, nem que o prémio ia ser atribuído hoje. Portanto, fiquei absolutamente surpreendido", disse ontem à Lusa. O júri distinguiu a obra de Pina pela sua "inventividade e a originalidade". "Sinto-me um bocado embaraçado, atendendo à qualidade das pessoas, ao Panteão a quem já foi atribuído anteriormente o prémio", disse o escritor.
Com 67 anos, o jornalista do Sabugal, licenciado em direito, dividiu-se por várias áreas da literatura. O homem dos quatro ofícios: poesia, teatro, literatura infantil e ficção.
Em 1973 editava o seu primeiro livro: "O País das Pessoas de Pernas para o Ar". Como o título indica trata-se de um livro infantil que explora um lado mais surreal e humorístico, como no conto do menino Jesus não queria ser Deus. A sua obra infantil rompeu com a tradição e já faz parte dela, ao ser incluído no Plano Nacional da Leitura. Em 1974, Manuel António Pinta lançava-se na poesia com "Ainda Não É o Fim nem o Princípio do Mundo Calma É Apenas Um Pouco Tarde". "Acaba por ser também um prémio dado à poesia, que faz todo o sentido, porque continuamos a ser um país de grandíssimos valores nessa área e com um reconhecimento que é sempre justo e positivo", afirmou José Luís Peixoto à Lusa. Mário Cláudio concorda e defende que premiar a poesia é importante, pois tem estado mais esquecida.
Manuel António Pina ainda escreveu para teatro, sendo "História do sábio fechado na sua biblioteca", a sua última peça. O nome do escritor está associado à história do jornalismo. "Inovou muito no jornalismo português. Deu alma às notícias, com uma abordagem mais poética, mais livre", defendeu o historiador Germano Silva.
Em 2003, Pina deixou o terreno mais que familiar da literatura infantil e aventurou-se na ficção para pessoas mais crescidas com "Os Papéis de K.". A sua obra está traduzida em França, em Espanha, na Dinamarca, na Alemanha, na Rússia, na Croácia, na Bulgária e nos Estados Unidos. O Brasil parece ser a próxima aposta, já que os trabalhos do poeta ainda não foram publicados na terra do samba. Pina é o 10º português a receber o prémio. No ano passado, o Camões, no valor de 100 mil euros, foi para o poeta brasileiro Ferreira Gullar. O primeiro vencedor do Prémio foi Miguel Torga, em 1989.»
12 de maio de 2011
11 de maio de 2011
9 de maio de 2011
Espero
Espero sempre por ti o dia inteiro,
Quando na praia sobe, de cinza e oiro,
O nevoeiro
E há em todas as coisas o agoiro
De uma fantástica vinda.
Sophia de Mello Breyner Andresen
Quando na praia sobe, de cinza e oiro,
O nevoeiro
E há em todas as coisas o agoiro
De uma fantástica vinda.
Sophia de Mello Breyner Andresen
4 de maio de 2011
26 de abril de 2011
Ponto, de Estrela Ruiz Leminski
«O mundo é feito de pontos. São muitos se forem pontos de vista. Poucos se forem pontos estratégicos. Muito húmidos se forem pontos de chuva. O mais gostoso é ponto de encontro, mas às vezes desencontra. Ou pontos de luz, um homem e uma mulher nus. Todos são pontos. O caminho entre dois uma reta. Uma linha. Um caminho que caminha sozinho. Fim da linha. Ou do fio. Fio da meada é na conversa. Conversas são feitas de pontos de enfoque. O palco também. Amores são pontos em comum. Os pontos são um.»
Estrela Ruiz Leminski (Curitiba, 1981) é escritora e compositora brasileira, filha dos poetas Paulo Leminski e Alice Ruiz. Formada em Música pela Faculdade de Artes do Paraná. Em 2004 lançou seu primeiro livro, Cupido, cuspido, escarrado, incluindo seus poemas feitos na infância e adolescência. Em 2009 participou da antologia "XXI poetas de hoje em dia(nte) e antologia dos poetas "Anos 2000" da editora Global. Em 2011 lançou o livro "Poesiaénão".
Estrela Ruiz Leminski (Curitiba, 1981) é escritora e compositora brasileira, filha dos poetas Paulo Leminski e Alice Ruiz. Formada em Música pela Faculdade de Artes do Paraná. Em 2004 lançou seu primeiro livro, Cupido, cuspido, escarrado, incluindo seus poemas feitos na infância e adolescência. Em 2009 participou da antologia "XXI poetas de hoje em dia(nte) e antologia dos poetas "Anos 2000" da editora Global. Em 2011 lançou o livro "Poesiaénão".
23 de abril de 2011
16 de abril de 2011
15 de abril de 2011
Trocas
Tinha uma amiga com quem queria ter dormido. A
amiga tinha outro amigo com quem dormiu depois
de saber que ele queria dormir com ela. Disse-lhe
depois que se não tivesse sabido que ele queria
dormir com ela teria dormido com ele sem dormir
com o outro. Mas o outro, que sabia que ela não
queria dormir com ele, dormiu com ela para que
ela percebesse que era melhor dormir com ele do
que dormir com o amigo. O amigo é que deixou
de ser amigo dele porque não gostou que a amiga
o tivesse preferido a ele. A amiga dos dois, por
fim, convenceu-os a não se zangaram por ela ter
dormido com o que não gostava dela, e acabou a
pedir ao primeiro que dormisse com ela para não
ficar triste. Mas o amigo não quis, porque já tinha
feito as pazes com o que dormira com ela, e não
queria que tudo voltasse ao princípio. E foi assim
que a amiga se zangou com o que queria ter dormido
com ela por ele não querer dormir com ela só
porque ela tinha dormido com o outro depois de
saber que o outro já tinha dormido com ela, e ele não.
Nuno Júdice
amiga tinha outro amigo com quem dormiu depois
de saber que ele queria dormir com ela. Disse-lhe
depois que se não tivesse sabido que ele queria
dormir com ela teria dormido com ele sem dormir
com o outro. Mas o outro, que sabia que ela não
queria dormir com ele, dormiu com ela para que
ela percebesse que era melhor dormir com ele do
que dormir com o amigo. O amigo é que deixou
de ser amigo dele porque não gostou que a amiga
o tivesse preferido a ele. A amiga dos dois, por
fim, convenceu-os a não se zangaram por ela ter
dormido com o que não gostava dela, e acabou a
pedir ao primeiro que dormisse com ela para não
ficar triste. Mas o amigo não quis, porque já tinha
feito as pazes com o que dormira com ela, e não
queria que tudo voltasse ao princípio. E foi assim
que a amiga se zangou com o que queria ter dormido
com ela por ele não querer dormir com ela só
porque ela tinha dormido com o outro depois de
saber que o outro já tinha dormido com ela, e ele não.
Nuno Júdice
13 de abril de 2011
12 de abril de 2011
9 de abril de 2011
noite de Teatro - 8 de Abril
Azul Longe nas Colinas, no TeCA com: Albano Jerónimo, Bruno Nogueira, Dinarte Branco, Elsa Oliveira, Leonor Salgueiro, Luísa Cruz, Nuno Nunes de: Dennis Potter encenação: Beatriz Batarda
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